HISTÓRIA DO DIREITO PENAL
O Direito penal não existiu sempre. Seu aparecimento se dá, propriamente, no período superior da barbárie, com a primeira grande divisão social do trabalho e a conseqüente divisão da sociedade em classes e a implantação do Estado. O Direito penal somente se estrutura quando a produção, já desenvolvida com o emprego de instrumentos de metal e da agricultura, apresenta considerável quantidade de reservas de excedentes e exige o suplemento de mão-de-obra, cindindo a antiga organização gentílica, alicerçada no trabalho solidário e comum, para substituí-lo pela propriedade privada dos meios de produção e pelo trabalho escravo. Com isso se estratificou a sociedade em classes, e, por conseqüência, se criaram contradições antagônicas que deveriam, agora, ser disciplinadas por um poder central e por normas rígidas, de caráter penal, para garantir a nova ordem.
A história do Direito penal consiste na análise do Direito repressivo de outros períodos da civilização, em uma época de muita religiosidade e de crenças em mitos, o Direito penal servia como modo de reparação para fenômenos naturais maléficos resultantes de forças divinas (“totem”), gerados por fatos praticados pelos indivíduos e que deveriam ser reparados. Para conter a ira divina, criaram-se proibições religiosas, sociais e políticas, conhecidas como “tabu” que em caso de desobediência acarretavam castigo. A infração totêmica ou a desobediência ao tabu levou a sociedade à punição do infrator gerando assim o que chamamos hoje de “crime’ e “pena”. O castigo infligido era o sacrifício da vida do próprio transgressor ou a “oferenda por este de objetos valiosos(animais, peles e frutas) à divindade, no altar montado em sua honra”. A pena, em sua origem remota, nada mais significava senão a vingança, revide à agressão sofrida, desproporcionada com a ofensa e aplicada sem preocupação de justiça determinando a vingança penal.
A vingança penal teve várias etapas de evolução mas as mesmas não se sucederam sistematicamente, ocorreram em épocas de transição e adoção de princípios diversos, normalmente envolvidos com a religião. Doutrinadores estabelecem divisões no que se trata de vingança penal, dividem em vingança privada, vingança divina e vingança pública, todas elas sempre profundamente marcadas por forte sentimento religioso/espiritual.a despeito da divergência, sem qualquer precisão, o mais importante, ao menos para ilustrar, é que se tenha noção ainda que superficial, do que caracterizou cada uma dessas fases. Uma das fases da vingança penal é baseada na reparação pelo infrator do dano gerado pelo não cumprimento regras antigas que eram expressas pelos deuses através de fenômenos naturais maléficos esta fase é denominada vingança divina, resultou da grande influência exercida pela religião na vida dos povos antigos. O princípio que domina a repressão é a satisfação da divindade, ofendida pelo crime. Pune-se com rigor antes com notória crueldade, pois o castigo deve estar em relação com grandeza do deus ofendido. A impregnação de sentido místico no Direito penal ocorreu desde suas origens mais remotas, quando se concebia a repressão ou castigo do infrator como uma satisfação às divindades pela ofensa ocorrida no grupo social. Trata-se do direito penal religioso, teocrático e sacerdotal, e tinha como finalidade à purificação da alma do criminoso, por meio do castigo. O castigo era aplicado, por delegação divina, pelos sacerdotes, com penas cruéis, desumanas e degradantes, cuja finalidade maior era a intimidação. Pode-se destacar como legislação típica dessa fase o código de Manu, embora legislação com essas características tenham sido adotadas no Egito (cinco livros), na China (livro das cinco penas), na Pérsia (Avesta), em Israel (Pentateuco) e na Babilônia.
Esse era, enfim, o espírito dominante nas leis dos povos do Oriente antigo (Além da Babilônia, China, Índia, Israel, Egito, Pérsia etc.). além da severidade, que era sua
característica principal, decorrente do caráter teocrático, esse direito penal era aplicado pelos sacerdotes.
Evolui-se, posteriormente, para a vingança privada, que poderia envolver desde o indivíduo isoladamente até o seu grupo social, com sangrentas batalhas, causando, muitas vezes, a completa eliminação de grupos. Quando a infração fosse cometida por membro do próprio grupo, a punição era o banimento (perda de paz) deixando-o à mercê de outros grupos, que fatalmente o levariam à morte. Quando, no entanto, a violação fosse praticada por alguém estranho ao grupo, a punição era a “vingança de sangue”, verdadeira guerra grupal.
Com a evolução social, para evitar a dizimação das tribos, surge a lei de talião, determinado a reação proporcional ao mal praticado: olho por olho, dente por dente. Esse foi o maior exemplo de tratamento igualitário entre infrator e vítima, representando, de certa forma, a primeira tentativa de humanização da sanção criminal. A lei de talião foi adotada no código de Hamurábi (Babilônia), no Êxodo (hebreus) e na Lei das XII Tábuas (romanos). No entanto, com o passar do tempo, como número de infratores era grande, as populações iam ficando deformadas pela perda de membro, sentido ou função, que o Direito Talional propiciava. Assim, evolui-se para a composição, sistema através do qual o infrator comprova a sua liberdade, livrando-se do castigo. A composição, que foi largamente aceita, na sua época, constitui um dos antecedentes da moderna reparação do Direito civil e das penas pecuniárias do Direito penal.
Mas, com a melhor organização social, o Estado afastou a vindita privada, assumindo o poder-dever de manter a ordem e a segurança social, surgindo a vingança pública, que, nos seus primórdios, manteve absoluta identidade entre poder divino e poder político.
A primeira finalidade reconhecida desta fase era garantir a segurança do soberano, por meio da sanção penal, ainda dominada pela crueldade e desumanidade, característica do direito criminal da época. Mantinha-se ainda forte influência do aspecto religioso, com o qual o Estado justificava a proteção do soberano. A Grécia, por exemplo, era governada em nome de Zeus; a Roma Antiga recebeu, segundo se acredita,a Lei das XII Tábuas. Finalmente, superando as fases da vingança divina e da vingança privada, chegou-se à vingança pública. Nesta fase, o objetivo da repressão criminal é a segurança do soberano ou monarca pela sanção penal, que mantém as características da crueldade e da severidade, com o mesmo objetivo intimidatório.
Na Grécia Antiga, em seus primórdios, o crime e a pena continuaram a se inspirar no sentimento religioso.Essa concepção foi superada com a contribuição dos filósofos, tendo Aristóteles antecipado a necessidade do livre-arbítrio, verdadeiro embrião da idéia de culpabilidade para o campo jurídico. Platão com as leis antecipou a finalidade da pena como meio de defesa social, que deveria intimidar pelo rigorismo, advertindo os indivíduos para não delinqüir.
Ao lado da vingança pública, os gregos mantiveram por longo tempo as vinganças divina e privada, formas de vingança que ainda não mereciam ser denominadas Direito penal.
DIREITO PENAL ROMANO
O Direito penal Romano oferece um ciclo jurídico completo, constituindo até hoje a maior fonte originária de inúmeros institutos jurídicos. Roma é tida como síntese da sociedade antiga, representando um elo entre o mundo antigo e o moderno. No período da fundação de Roma(753 a.C), a pena era utilizada com aquele caráter sacral que já se referimos, confundindo-se a figura do Rei e do Sacerdote, que dispunham de poderes ilimitados, numa verdadeira simbiose de Direito e religião.
Durante a primitiva organização jurídica da Roma monárquica prevaleceu o Direito consuetudinário, que era rígido e formalista. A Lei das XII Tábuas, foi o primeiro código romano escrito, que resultou da luta entre patrícius e pebleus. Essa lei inicia o período dos diplomas legais, impondo-se a necessária limitação à vingança privada, adotando a lei de talião, além de admitir a composição.
Na Roma da realeza surge a diferenciação entre crimes públicos e privados, punidos
pelo ius publicum e ius civile, respectivamente, sendo que o julgamento dos crimes públicos era atribuição do Estado, através do magistrado, era realizado por tribunais especiais, cuja sanção era a pena de morte. Já o julgamento dos crimes privados era conferido ao particular ofendido, intervindo o Estado somente para regular o seu exercício.
Na época do império surge uma nova modalidade de crie os crimina extraordinária que resulta na aplicação de uma pena individualizada pelo arbítrio do caso concreto. No Direito Romano clássico surge a tipologia dos crimes, catalogando comportamentos considerados criminosos através da leges cornelie que tratava de crimes patrimoniais e da leges julie que se preocupa com crimes praticados contra o Estado.
Com o aparecimento dos chamados crimes extraordinários, retorna a sanção por pena de morte, nesta época os romanos denominavam como agravantes e atenuantes o dolo e a culpa na medição da pena.
Finalmente, nesse período, os romanos não realizavam uma sistematização dos institutos de Direito penal. No entanto, a eles remonta a origem de inúmeros institutos penais que na atualidade continuam a integrar a moderna dogmática jurídico-penal. Na verdade, os romanos conheceram o nexo causal, dolo, culpa, caso fortuito, inimputabilidade, menoridade, concurso de pessoas, penas e suas mediação. Não procuraram defini-los, trabalhavam casuisticamente, isoladamente, sem se preocupar com a criação, por exemplo, de um,a Teoria Geral de Direito penal.
DIREITO PENAL GERMÂNICO
O Direito Germânico primitivo não era composto de leis escritas, caracterizando-se como um Direito consuetudinário. O Direito era concebido como uma ordem de paz e a sua transgressão como uma ruptura da paz, pública ou privada, segundo a natureza do crime, privado ou público. A reação à perda da paz, por crime público, autorizava que qualquer pessoa pudesse matar o agressor. Quando se tratasse de crime privado, o transgressor era entregue a vítima e seus familiares para que exercessem seu Direito de vingança, que assumia um autêntico dever de vingança de sangue com isso conheceram a vingança de sangue que somente em etapas mais avançadas com o fortalecimento do Estado foi substituída pela composição, voluntária, depois obrigatória. A composição representava um misto de ressarcimento e pena: parte destinava-se à vítima ou a seus familiares, como indenização pelo crime, e parte era devida ao tribunal ou ao rei, simbolizando o preço da paz. Aos infratores que não podiam pagar pelos seus crimes eram aplicadas em substituição penas corporais.
Só tardiamente o Direito Germânico acabou adotando a pena de talião,por influência do Direto Romano e do Cristianismo.
DIREITO PENAL CANÔNICO
O Direito penal canônico que com o ingresso do Cristianismo na monarquia franca em 496 d.C, com a conversão de Clodovéu, surgindo à repressão penal de crimes religiosos e a jurisdição eclesiástica, protegendo os interesses de dominação.
Primitivamente o Direito penal canônico teve caráter disciplinar. Aos poucos, com a crescente influência da Igreja e conseqüentemente o enfraquecimento do Estado, o Direito canônico foi-se estendendo a religiosos e leigos, desde que os fatos tivessem conotação religiosa. Pela primeira vez era julga do sempre por um tribunal da Igreja, qualquer que fosse o crime praticado, na segunda a competência eclesiástica era fixada, ainda que o crime fosse praticado por um leigo. Quem lesava a ordem jurídica laica, eram julgados pelos tribunais do Estado e lhes correspondiam sanções comuns, quem ofendia o Direito Dino era julgado pelos tribunais eclesiásticos, e eram punidos com as poenitentiae.
O Direito canônico contribuiu consideravelmente para o surgimento da prisão moderna, precisamente do vocábulo “penitência” que deu origem a palavra “penitênciária”, e considerando que o crime era um pecado contra as leis humanas e divinas, e que as idéia de fraternidade, redenção e caridade da Igreja foram transladas ao direito punitivo, procurando corrigir e reabilitar o delinqüente.
DIREITO PENAL HUMANITÁRIO
Esse movimento baseado em idéia iluministas e tendo seu apogeu na Revolução Francesa teve por objetivo culminar idéias e procedimentos de excessiva crueldade, castigos corporais e a pena capital. O Direito era um instrumento gerador de privilégios, o que permitia aos juízes, dentro do mais desmedido arbítrio, julgar os homens de acordo com sua condição social. Inclusive os criminalistas mis famosos da época defendiam em suas obras, procedimentos e instituições que respondiam à dureza de um rigoroso sistema repressivo.
Os iluministas defendiam que a pena deveria ser proporcional ao crime cometido, devendo assim levar em consideração, quando imposta, as circunstâncias pessoais do delinqüente, seu grau de malícia, e sobretudo, produzir a impressão de ser eficaz sobre o espírito dos homens, sendo, ao mesmo tempo, a menos cruel para o corpo do delinqüente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITENCOURT, CEZAR ROBERTO, TRATADO DE DIREITO PENAL, editora SARAIVA, 9º edição 2004.
MIRABETE, JULIO FABRINI, MANUAL DE DIREITO PENAL, editora ATLAS, 18ª edição 2002.